Boa parte das tribos indígenas brasileiras pautavam suas moradias pela terra que ocupavam, desse modo quando essa terra ao redor  cessasse de prover a alimentação era hora de desmontar as ocas e partir em busca de outro local onde a terra não estivesse exaurida.  E assim, novamente fixar morada.

Estou prestes a me mudar pela décima terceira vez. A sétima só esse ano. E se existe alguma coisa que aprendi com todos esses lugares é que nem toda casa é lar, nem todo lar é casa e que é necessário sim bater em retirada, sempre que possível. De todas essas experiências posso destacar duas: Um anti-lar e um lar-total, o tal baú.  Doze metros quadrados em Paris, meu anti-lar, durou por cerca de 3 meses ou melhor, durei cerca de três meses dentro disso. Um verdadeiro corredor de aproximadamente 6x2metros donde tudo vinha embutido. Um sofá cama  responsável por foder de vez minhas com as minhas costas, o banheiro impossivel de entrar sem se debater e uma cozinhazinha que era até a “parte da casa que eu mais gostava”.  Porém antes mesmo dos 12m2 existiu o baú. Haters gonna hate mas o baú foi projetado por Niemeyer e por mais que o projeto tenha sido todo executado as avessas num Brasil progressista e apressado, o baú tinha ‘o quê da coisa’. Explico melhor: fora projetado baseado nos falanstérios (ou Comunidades Intencionais) idealizados pelo filósofo Francês Charles Fourier. Então mesmo com todo o “mal-acabado”, aquilo havia sido pensado de maneira a melhorar a vida das pessoas. O que é louvável. O baú, para mim é um baú por conta da sua enorme sala, com sua enorme janela, seu pé direito alto e seu teto curvo, como o de um baú. Um pouco mais que isso: um ponto de refúgio central e um ponto de resistência por estar numa área nobre e ainda assim compor uma verdadeira favela vertical. O projeto de certo não foi feito para temporários, tinha caráter agregador de maneira que quem entrasse ali sentisse o peso de algo pensado para pessoas e não na sazonalidade de quem mora em Paris e precisa a todo custo se matar por um puxadinho do sexto andar de um prédio, sous-les-toits, “sem-elevador-sem-escada” como eu mesma costumava dizer. Por isso acredito na arquitetura assim, como um baú. E num baú só se guardam coisas valiosas coisa que supostamente todos deveriam sentir ao pertencer a um espaço: devidamente guardados e não o contrário, oprimidos e acuados. Porém e para além também acredito  na ideia ancestral de que a “terra se exaure” ao nosso redor todos os dias, as relações apodrecem, se danificam ou simplesmente param de dar frutos, coisas que só se consertam a medida que se parte para outro lugar. Pode ser a roça da sua mãe, o sofá da sua irmã, não importa. É partindo pouco a pouco que se  faz o renovar daquela faísca que a gente têm quando vê algo pela primeira vez, sem a raiva que embaça o cotidiano, ou o cotidiano que embaça os olhos.